domingo, 6 de dezembro de 2009

A Sociedade da Fama Flutuante

No início do século XXI, percebe-se uma tendência mundial em que as celebridades ou os famosos vivem uma espécie de câmbio de popularidade na chamada sociedade da fama flutuante. Ora eles são apresentados no auge de suas carreiras, ora na decadência do ostracismo. E essa alternância entre os dois pólos extremos são noticiadas com uma impressionante variação. Como por exemplo, notícias de que Amy Winehouse está internada numa clínica de reabilitação ou de que ela fez uma cirurgia para implantar próteses de silicone nos seios poderiam facilmente ser divulgadas no mesmo dia. No entanto, tanto as notícias boas quanto as ruins que são veiculadas pela mídia servem para ressaltar o status de celebridade do artista.
O que também é possível de identificarmos nessa sociedade é o aumento do surgimento instantâneo dos chamados anônimos famosos. Estes não precisam possuir nenhuma habilidade artística, política ou científica. Basta que eles consigam atingir uma projeção na mídia através de reality shows ou de alguns casos inusitados como o que aconteceu recentemente com a estudante Geisy Arruda da Universidade Bandeirante de São Paulo, conhecida como Uniban.
Geisy Arruda, então aluna do curso de Turismo da Uniban, foi hostilizada por outros alunos da universidade sendo chamada de prostituta e, segundo ela, ameaçada de estupro dentro do estabelecimento acadêmico pelo simples fato de ter usado um minivestido rosa naquela noite de 22 de outubro de 2009. O caso rapidamente tomou proporções nacionais devido à divulgação, no You Tube, de vídeos que alguns alunos fizeram com seus aparelhos celulares.
O You Tube tornou-se uma poderosíssima ferramenta no processo de celebrização destes “anônimos famosos”. Visto que, este website pode fazer uma projeção em escala muitas das vezes global que antes só era possível através da TV ou do cinema. Recentemente ficou conhecido no Brasil o caso da mulher que, da calçada do prédio do namorado Pedro, as berros exigia que ele devolvesse o seu chip do aparelho de celular. O vídeo além de divulgado pelo You Tube passou a ser divulgado pelas redes de TV. Pedro tornou-se um anônimo famoso que chegou a dar entrevista ao Fantástico e foi criado até um funk com os berros da mulher que optou por permanecer anônima porque só queria o seu chip de volta.
Porém, nada se compara à projeção que a anônima famosa Geisy Arruda obteve a nível nacional. Após a divulgação de seus vídeos na internet, a imprensa noticiou seu caso diariamente até que o fato gerou algumas consequencias. A Uniban decidiu expulsar a aluna que, segundo eles, disseminou a baderna na instituição. O Ministério da Educação quer que a universidade dê uma explicação plausível a respeito da expulsão da estudante de turismo. Manifestações foram realizadas por estudantes ligados à UNE na porta da instituição. Geisy ganhou, instantaneamente, advogado, assessor de imprensa e cabeleireiro que lhe prestam serviços quase que gratuitamente. A Playboy faz sondagens para que Geisy exiba seu corpo num ensaio fotográfico. Tornou-se musa da escola de Samba Porto da Pedra, de São Gonçalo. Seu caso é noticiado e comentado em uma série de debates, nos programas vespertinos, nas revistas semanais e de fofocas, nos websites, nos blogs, nas comunidades e fóruns virtuais.
Ela também participa em uma série de programas nas principais redes de TV do país num incrível espaço de tempo de uma semana como Dia Dia e CQC, da Band; Superpop e TV Fama, da RedeTV!; Fantástico, Casseta & Planeta Urgente e Jornal Hoje, da Rede Globo; Programa do Ratinho, do SBT; Geraldo Brasil, Programa do Gugu, Domingo Espetacular e Hoje em dia, da Rede Record. E, em declarações que deu a alguns destes programas, Geisy afirmou que fora vítima dentro da Uniban e que entraria com uma ação contra a Universidade devido aos danos morais que afirma ter sofrido.
Esta projeção nacional e o enfoque dado pelas principais emissoras do país é, sem dúvida alguma, o sonho de qualquer artista. Porém, o que percebemos é que cada vez mais é dado destaque aos chamados anônimos famosos e seus casos inusitados. Tal fato está estritamente ligado ao fato de alguns segmentos da classe artística manifestarem publicamente o seu repúdio ao destaque exacerbado dado pela mídia aos aônimos famosos.
Alguns programas de TV como o Pânico na TV da RedeTV utiliza-se desta ferramenta de mostrar anônimos fazendo coisas inusitadas e acaba dando-lhes a oportunidade de ter seus 15 minutos de fama, assim como já previa Andy Warhol na década de 1960. No programa são exibidas mulheres que fogem ao padrão de beleza fazendo poses sensuais na praia, coberturas de festas com ex-participantes de reality shows e até entrevistas inusitadas com moradores de rua que são levados a contar piadas ou dançar. Tudo por alguns minutos de fama.
No entanto, o programa excede os limites por tentar utilizar-se do mesmo artifício e submeter às mesmas situações nomes já consagrados da classe artística brasileira. Ao convencer o político Eduardo Suplicy a vestir uma sunga por cima de seu terno ou sujar os cabelos do ator baiano Wagner Moura com gel. Ao ser vítima dessa brincadeira realizada pelo programa. Wagner tornou pública uma carta em que repudiava esse tipo de programa ao dizer: “Compartilho minha indignação porque sei que ela diz respeito a muitos; pessoas públicas ou anônimas, que não compactuam com esse circo de horrores que faz, por exemplo, com que uma emissora de TV passe o dia INTEIRO mostrando imagens da menina Isabella. Estamos nos bestializando, nos idiotizando. O que vai na cabeça de um sujeito que tem como profissão jogar meleca nos outros? É a espetacularização da babaquice. [...] Digo isso com a consciência de quem nunca jogou o jogo bobo da celebridade. Não sou celebridade de nada, sou ator. Entendo que apareço na TV das pessoas e gosto quando alguém vem dizer que curte meu trabalho, [...]. Gosto de ser conhecido pelo que faço, mas não suporto falta de educação. O preço da fama? Não engulo essa”.
Vivemos numa sociedade em que a fama é flutuante e a maioria das pessoas que tornam-se anônimos famosos cai, posteriormente, na decadência do ostracismo. Fenômenos midiáticos como o de Pedro do chip e o de Geisy Arruda são, lentamente, deixados de lado pela mesma mídia que sempre parte em busca de anônimos dispostos a tornarem-se famosos. O que ocasiona um outro fenômeno conhecido como a decadência das celebridades.
Torna-se cada vez mais comum o absoluto esquecimento de determinadas celebridades, com habilidades artísticas ou não, que já tiveram uma visibilidade anteriormente e que hoje experimentam o total ostracismo. Como por exemplo o cantor e compositor Belchior que atualmente vive numa cabana isolada no Uruguai. Cada vez mais astros e estrelas tornam-se astros decadentes, ou cometas, e a esse fenômeno é dado o nome de cometismo. O “cometismo” é um fenômeno temporário que tende a projetar celebridades esquecidas por um curto espaço de tempo na mídia e, posteriormente torna a empurrá-los para o ostracismo. No caso de Belchior, ele já foi um astro e caiu no ostracismo. A mídia dá-lhe um enfoque rápido, fazendo com que ele entrasse em um repentino processo de cometização e, depois ele tende a voltar para o ostracismo.
Dentro deste fenômeno do cometismo é observada uma tendência que leva estas celebridades a introduzirem-se no mercado crescente atualmente no Brasil, a pornografia. A pornografia permite que estas celebridades ganhem visibilidade e projeção nacional através da mídia por um período efêmero. Atualmente, a Brasileirinhas é a principal produtora de fimes adultos no país que foca seu mercado na venda de DVDs. Inúmeros são os astros decadentes, cometas, que já participaram de filmes eróticos no país. São eles: os atores Alexandre Frota, Leila Lopes, Regininha Poltergeist, Márcia Imperator, Oliver e Mateus Carrieri; as cantoras e bailarinas: Gretchen e Rita Cadillac; a ex-prostituta e escritora Bruna Surfistinha e a transsexual e ex-participante de reality show Bianca Soares.
A participação destes cometas em filmes pornográficos tende a dar-lhes a mesma visibilidade e projeção na mídia conseguidas pelos anônimos famosos. Porém, que não é duradoura e depois de alguns meses tornam a cair no ostracismo sendo eles bons exemplos para pensarmos numa sociedade cuja fama tende a ser cada vez mais flutuante neste início de século.
É importante ressaltar que durante a década de 1990, Alexandre Frota atuou em novelas em algumas emissoras de TV do país, sendo a última Marisol (2002) do SBT. Frota inicia-se no mercado pornô em 2004 atuando nos seguintes filmes: Sexo, Suor e Samba; A Bela e o Prisioneiro; Obsessão. E consegue, surpreendentemente, uma projeção como cometa que nunca havia tido enquanto era astro de novelas da Rede Globo. Portanto, é importante destacar que nem sempre um astro tem mais visibilidade que um cometa, nessa sociedade de fama flutuante do início do século XXI. Recentemente Frota trabalhou como diretor assistente do reality show A Fazenda, da Rede Record.
A atriz Leila Lopes teve seu auge como estrela durante a década de 1990 no Brasil atuando em algumas novelas como Pantanal (1990), O Guarani (1991), Despedida de Solteiro(1992), Renascer (1993), Tropicaliente (1994), O Rei do Gado (1996) e Malhação (1997). No início da década de 2000, cai no absoluto ostracismo. Quando no final da mesma década ressurge como cometa atuando nos seguintes filmes pornográficos: Pecados & Tentações (2008); Pecado sem Perdão (2009); Pecado Final (2009). Com a divulgação de seus filmes em 2009 e sua retomada projeção nacional diante da mídia, Leila dá entrevistas onde tente reafirmar seu caráter artístico e sua profissão de atriz: "As cenas de sexo são lindas, não são vulgares. [...] Dei tudo de mim, me dediquei muito, incorporei a Marlene e a vivi intensamente, com a mesma disciplina que interpretei outras personagens. Mas depois que voltei a ser a Leila Lopes eu chorei muito, porque não estou acostumada a ir numa balada e 'ficar', pra mim tem que ser tudo romântico. E por mais que o Carlão seja educado e gentil, não deixa de ser um estranho", explicou Leila, referindo-se a Carlos Bazuca, seu companheiro de filmagem. "Foi altamente interpretação. Tem que ter muita técnica, colocação de corpo, postura para a câmera”, contou.
Apesar de ter recebido propostas para atuar em outros filmes pornográficos e para apresentar um programa sobre sexo na TV a cabo, Leila Lopes mostrava-se insatisfeita e apresentava já em meados de 2009 sinais de depressão. Em 03 de Setembro de 2009, foi divulgado pela imprensa que Leila estava com uma doença misteriosa e que se submeteria a um tratamento. Leila apareceu em programas de TV como o TV Fama da RedeTV e chegou a dar uma entrevista deitada numa cama de hospital comentando sobre a doença e sobre os exames aos quais se submeteria.
Não aguentando sua atual condição, Leila Lopes suicida-se na noite de 03 de dezembro de 2009 após ingerir veneno para rato. Dando fim a uma carreira de novelas, na década de 1990, e de filmes pornográficos, no fim da década de 2000. É importante perceber que nesta sociedade cuja fama tornou-se flutuante, a projeção dos anônimos famosos e dos cometas pode ser extremamente prejudicial a eles quando combinado com problemas de saúde, financeiros e/ou psicológicos. Devemos fazer com que os meios de comunicação zelem pelo verdadeiro artista dando-lhe o devido reconhecimento. Somente desta forma poderemos verificar a mudança no atual quadro em que cada vez mais anônimos famosos e cometas são celebrizados reforçando assim o caráter fútil e superficial desta sociedade que tornou-se marcante no início do século XXI.

Por Jurdiney da Costa Pereira Junior